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O eterno debate sobre reforma tributária
Sandro Renato Maskio
27/03/2023 | 07:00
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O atual governo elegeu a reforma tributária como uma das prioridades no campo econômico. O tema não é novo. Me arrisco a dizer que está presente desde o ano seguinte à última grande alteração no sistema tributário nacional, que ocorreu em 1988.

A questão tributária é uma das mais complexas no debate econômico, dado seus múltiplos impactos sobre a dinâmica da sociedade. O tema por si só é desgastante aos políticos, pois todos demandamos bons serviços públicos ao mesmo tempo em que não consideramos prazeroso pagar impostos. Entretanto, é necessário deixar claro que sem arrecadação não há como o Estado prestar serviços públicos.

Para além da finalidade fiscal, arrecadatória, se faz necessário desvendar a existência de outros objetivos que a organização de um sistema tributário deve almejar para se tornar mais qualitativo. Destaco primeiramente o objetivo distributivo. O ideal neste quesito é conseguir estabelecer mecanismo tributário que consiga tributar proporcionalmente mais as pessoas que têm mais renda e patrimônio, e menos as com menor capacidade de pagamento. A isso chamamos de progressividade tributária.

No Brasil atual, segundo dados da Secretaria do Tesouro Nacional, pouco mais de 28% da carga tributária arrecadada em 2021 foram provenientes de impostos diretos sobre a renda ou sobre a propriedade. A maior parte da arrecadação veio de impostos sobre produção ou comercialização de bens ou serviços (43%) e de contribuições sociais (24%), ambos indiretos. Estes últimos compõem os custos dos diferentes processos de produção e estão embutidos nos preços das mercadorias. Consequentemente, no ato do consumo dos diversos produtos, arcamos com os impostos indiretos de forma não transparente, independente da capacidade de pagamento de cada um.

Como consequência, já demostrado em diversos estudos, a carga tributária brasileira, que foi equivalente a aproximadamente 34% do PIB em 2021, incide de forma regressiva sobre os cidadãos. Ou seja, os mais pobres pagam proporcionalmente mais impostos comparativamente à sua renda, embora possam acreditar que não, porque pagam pouco em impostos diretos.

Esta é uma distorção que tem de ser eliminada do sistema tributário, pois contribui com a piora da distribuição de renda entre as diferentes classes sociais, além de reduzir a eficácia de outros esforços no sentido de melhorar essa destruição de renda.

Em segundo lugar, nem por isso menos importante, ainda considerando a composição da arrecadação tributária, os impostos sobre bens e serviços representaram pouco mais de 43% do total arrecadado em 2021. Sem contar as contribuições sociais. Estes oneram o processo produtivo e reduzem a competitividade da produção local, com efeitos de retração da produção interna e reflexos sobre a capacidade de crescimento econômico, geração de emprego e renda.

Do ponto de vista qualitativo, se a reforma tributária conseguisse ao menos amenizar estas duas grandes distorções, poderíamos considerar que seriam dados passos no caminho certo.

Divisão entre Federação
Ocorre que há outras questões que envolvem a reforma tributária e que também são espinhosas. Em especial a discussão sobre a divisão do volume arrecadado entre governo federal, Estados e municípios. Esta divisão também acarretará alteração da redistribuição de tarefas e obrigações entre os entes da federação, para que não se gere assimetrias e não inviabilize a operacionalização das políticas públicas pelos mesmos.

Há ainda a necessidade de tornar o sistema arrecadatório mais simples, melhorar a transparência ao contribuinte e a efetividade econômica dos tributos, entre outros. Há décadas vem se discutindo a necessidade da reforma tributária tento em vista as questões apontadas acima. Dada a complexidade do tema e as melhorias qualitativas que devem ser almejadas, não acredito que uma mudança radical (revolução) do sistema tributário seja o melhor caminho.
Seria uma reforma pontual, estanque, capaz de lidar com a multiplicidade de questões em torno do tema? Seria melhor adotarmos um processo de reforma tributária ao longo do tempo, com alterações paulatinas, programadas, estabelecendo uma trajetória para promover as reformas gradualmente, em busca da melhora qualitativa do mesmo? Haveria maturidade social e política para este processo, que certamente perduraria o período de gestão de alguns governos?

Uma questão é certa: se não pensarmos propostas que lidem com a questão tributária como um sistema, em seu conjunto, corremos o risco de realizar apenas alterações periféricas e fatiadas, com resultados qualitativos temerários.

Material produzido por Sandro Renato Maskio, coordenador de Estudos do Observatório Econômico e professor do curso de Ciências Econômicas da Universidade Metodista de São Paulo 




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