Temporada de Chuvas Titulo Até quando?
Moradores do Grande ABC sofrem com tragédias provocadas pelas chuvas

Durante o ano, além dos pontos de alagamento nos sete municípios, pelo menos 38 habitações foram interditadas em Santo André, São Bernardo e Diadema por risco de deslizamento

Thainá Lana
01/01/2023 | 11:02
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Especialista ressalta necessidade de adotar medidas complementares para combater enchentes na região (Claudinei Plaza/DGABC)


Os moradores do Grande ABC sofrem há anos com diferentes tragédias provocadas pelas fortes chuvas, que são mais intensas durante o período de outubro a abril. Em 2022 não foi diferente. Durante o ano foram registrados diversos pontos de alagamento nos sete municípios, pelo menos 38 habitações foram interditadas em Santo André, São Bernardo e Diadema por risco de deslizamento e foram contabilizadas ocorrências por falta de energia elétrica e queda de árvore.

Os temporais do ano passado fizeram duas vítimas. No dia 23 de novembro um homem morreu em Mauá, após ter o carro arrastado pela água até o córrego Estrada do Britador. O segundo incidente fatal ocorreu dez dias depois em São Bernardo, quando o catador de recicláveis, Marcos de Araújo Rocha, 41 anos, caiu no córrego Taioca enquanto tentava atravessar o rio por uma ponte precária de madeira.

Não há muito tempo, há quase quatro anos, o Grande foi palco de uma das piores enchentes da história, que deixou dez mortos e 284 pessoas desabrigadas. Em março de 2019, Santo André, São Bernardo e Ribeirão Pires registraram 150 milímetros de chuva, quando o normal para um dia de grandes temporais não passa de 80 milímetros. Todos os anos, as prefeituras da região realizam ações preventivas para tentar reduzir o impacto das chuvas, além de manutenção preventiva e limpeza nos equipamentos destinados para reter as águas das tempestades nas cidades. Mas por que, mesmo com tantos esforços, as tragédias continuam ocorrendo?

Não uma alternativa única que vá impedir as consequências das fortes chuvas, que estão mais intensas a cada ano devido às mudanças climáticas, conforme aponta o pesquisador do laboratório de gestão de riscos da UFABC (Universidade Federal do ABC), Rodolfo Baesso Moura. Nesta quinta e última reportagem da série Temporada de Chuvas, publicada aos domingos durante o mês passado no Diário, o especialista apresenta medidas de infraestrutura complementares as já existentes (canalização de córregos e piscinões), para combater às enchentes e outras ocorrências.

“A forte chuva no Grande ABC é um problema crônico e histórico e, precisamos aprender a conviver com o problema, porque não há uma única solução. O que precisa ser feito para tentar minimizar o impacto das tempestades é implementar um conjunto de iniciativas em caráter regional. O problema é radical, então as medidas também precisam ser radicais”, afirma Moura. “Precisamos segurar a água da chuva na parte alta das cidades, antes que chegue nos pontos mais críticos. A instalação de piscininhas (reservatórios menores) é um dos caminhos. Caixas de reúso nas residências (para utilização da água) e reservação da água em lotes privados próximos as bacias são algumas alternativas”, explica.

Infraestrutura verde é outra possibilidade para combater às chuvas, aponta o pesquisador. Algumas ações podem ajudar a aumentar a permeabilidade do solo, como a instalação de jardins suspensos nas cidades e aumento da arborização urbana. “É preciso investir também em áreas com múltiplos usos, como o Parque Central, em Santo André, por exemplo, que além de ofertar espaço de lazer, os lagos exsistentes ajudam a reter a água durante as chuvas.”

Além das ações complementares citadas, o especialista ressalta a necessidade de articulação regional entre os sete municípios. “A diferença de recursos técnicos e financeiros entre as cidades impede os avanços na região. Como alternativa, seria necessário criar um fundo regional, gerido talvez pelo Consórcio Intermunicipal do Grande ABC, para investir em ações alternativas”, complementa. “O que foi feito até agora não deu conta. As bacias geográficas não respeitam os limites que são impostos pelas cidades. O problema é intermunicipal”, finaliza.

Nupdecs atuam na prevenção de riscos em comunidades da região
Além das ações realizadas pelo poder público, o enfrentamento às enchentes, deslizamento de terras e outras consequências provocadas pelas chuvas também conta com o apoio de voluntários dos Nupdecs (Núcleos Comunitários de Proteção e Defesa Civil).

Os integrantes fazem o papel de agentes da defesa civil comunitários, percebendo os riscos para tentar evitar desastres, acionamento dos órgãos de atendimento e emergência, além de auxiliar, caso necessário, no primeiro atendimento. As defesas civis de Santo André, São Bernardo, Mauá e Ribeirão Pires contam com a parceria de Nupdecs distribuídos por diversas comunidades – Diadema e Rio Grande da Serra não têm núcleos comunitários constituídos. São Caetano não informou.

Para auxiliar nas ocorrências, os membros recebem diversos tipos de treinamentos, com base na característica de cada local. Preservação ambiental, noções básicas de meteorologia, análise de riscos geológicos e estruturais são alguns dos módulos aplicados. Morador do bairro Capuava, em Santo André, Ivan Fernandes Pires, 33 anos, é um dos coordenadores do núcleo comunitário do local, que é composto por 40 pessoas. O bairro é caracterizado pela Defesa Civil como risco tecnológico, por conta da proximidade com o Polo Petroquímico.

“Durante a temporada de chuvas, ficamos sempre alerta nas previsões metereológicas que são enviadas para os voluntários. Todos os membros são treinados para atuarem em casos de emergência, seja geológica ou tecnológica e, assim, poderem auxiliarem os vizinhos. É essencial que as pessoas tenham noções básicas de primeiros socorros e prevenção de riscos. É um trabalho coletivo e essencial, não apenas nas temporadas de chuvas”. Sócio de Pires na empresa de treinamentos de primeiros socorros, Malcoln Douglas Rafael, 48, também é membro do Nupdec Capuava, mesmo sem morar no local, e realiza ao lado do parceiro busca ativa na comunidade para ampliar o número de membros. “É um trabalho de formiguinha, vamos de casa em casa, levando informação e mostrando a importância do núcleo”, conta.

A diretora da Defesa Civil de Santo André, Priscila de Oliveira, explica que os Nupdecs são o elo mais importante do sistema de prevenção de riscos. “É a própria comunidade que sofre os impactos de um desastre e não conseguimos estar em todos os lugares ao mesmo tempo. O principal papel do voluntário é identificar os sinais para evitar desastres e ajudar a salvar as pessoas”, conta. O município andreense possui 230 membros em nove comunidades. A última atuação do Nupdec foi no início de dezembro do ano passado, quando um integrante do Morro da Kibon alertou o órgão sobre o risco de inundação de uma área. “Alguém realizou o descarte irregular de entulho na calha de drenagem localizada na comunidade e, após o aviso, conseguimos retirar o material. O voluntário ajudou a evitar que as casas fossem inundadas.”




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