ABC da Economia Titulo
O novo governo e as reformas
Adhemar S. Mineiro
05/12/2022 | 13:18
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Em nota técnica na próxima Carta de Conjuntura da USCS, na qual reproduzimos parte de outra publicação nossa, tratamos de alguns desafios postos para o novo governo. 

O primeiro é a questão do teto de gastos. Pelas várias medidas da prática orçamentária em seu governo, poder-se-ia dizer que o chamado teto de gastos foi abandonado pelo governo Bolsonaro. Alguns dizem que o teto nunca existiu, porque as exceções já se abriram no governo Temer. O debate é se o teto já não existe mais ou se ele em algum momento existiu. Enquanto a visão liberal gerenciava o orçamento, não havia de fato preocupação. Quando se começou a discutir a inclusão dos gastos sociais no orçamento, o tema entrou em discussão como um divisor de águas. 

É preciso garantir os gastos sociais, e aqui estamos falando de programas contra a miséria e a fome, e da ampliação do salário mínimo. A maior parte da população não pode ser condenada à miséria. O corte de gastos em áreas como saúde e educação é insustentável. Há de se reestruturar um estado nacional destruído pelas políticas de cortes, sem o que não se implementa políticas públicas eficientes. E é fundamental expandir o gasto público para a economia voltar a crescer, e onde o crescimento resulte em aumento da arrecadação e equilíbrio fiscal real e sustentado. 

Temos que discutir o orçamento como um todo, no futuro, o orçamento a ser administrado pelo governo eleito no ano que vem é em boa medida o orçamento proposto pelo atual governo. Para além de remendos que possam ser feitos agora, é fundamental, de acordo com a legislação orçamentária, aprofundar esses debates na discussão do Plano Plurianual, de forma a que os objetivos, as tarefas e o modo de fazer estejam claros ao longo de um período, ao longo de um mandato presidencial, sancionados pelo Congresso. Com uma discussão geral do orçamento podemos chegar a regras que garantam ao mesmo tempo um orçamento flexível e anticíclico de forma a permitir que o gasto público possa ser usado para ativar a economia em momentos de recessão e estagnação, e a própria questão do que é uma dívida pública sustentada. 

O ponto seguinte é a reforma trabalhista. A reforma de 2017 teve como centro a flexibilização e a perda de direitos dos trabalhadores, e a tentativa de inviabilizar a participação dos sindicatos nos processos de negociação. 

É preciso rever esse viés e fazer alterações que tomem em consideração as mudanças na realidade do mundo do trabalho, afinal nossa CLT é dos anos 1940. Todas as consecutivas reestruturações tecnológicas das últimas décadas, operaram para aumentar a flexibilização do trabalho, aumentar a componente de serviços no emprego e, no período mais recente, aumentar a informalização, o trabalho em plataformas ("uberização do trabalho"), a flexibilidade do trabalho. 

A discussão agora não pode ser simplesmente voltar atrás na legislação do trabalho. É preciso considerar as mudanças recentes na operação do capitalismo em nível nacional e mundial. Mas para dar conta de nossas necessidades de bens e serviços, precisamos trabalhar menos, então que todos trabalhem menos, para que muitos sejam excluídos do mercado de trabalho. Sem essa questão do tempo de trabalho a equação não fecha. 

As alterações têm que ser visando viabilizar a negociação coletiva, e não apenas a retirada de direitos dos trabalhadores. 

A discussão do financiamento da Previdência Social tem que ser retomada. O capítulo sobre saúde, assistência e Previdência na Constituição de 1988 era a base de um "pacto social". As alterações que foram feitas desde 1990 foram desfazendo os preceitos de redução de disparidades, previstos inclusive nos mecanismos de financiamento que foram postos nesse capítulo constitucional, de modo a permitir que recursos que deveriam financiá-lo pudessem ser realocados para outros fins ­ como pagamentos de encargos da dívida pública, por exemplo. É essencial reconstituir o pacto constitucional de 1988. Se a discussão previdenciária precisa ser atualizada isso tem que ser feito não apenas pelos antolhos da visão fiscalista, mas considerar inclusive que o aumento da formalização do emprego e dos salários de base contribui essencialmente para a sustentação do sistema previdenciário que queremos ver construído no País.

Esta coluna foi escrita por Adhemar S. Mineiro, economista e colaborador voluntário do Observatório de Políticas Públicas, Empreendedorismo, Inovação e Conjuntura da Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS).




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