Economia Titulo Desvendando a economia
Deflação e processo inflacionário
Sandro Maskio e Natasha Jacoud
24/10/2022 | 13:21
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Pelo terceiro mês consecutivo, o Brasil apresentou deflação. Em setembro o resultado foi de - 0,29%, conforme mostra o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor ) apurado pelo IBGE, acumulando alta de 4,09% ao longo de 2022 e de 7,17% nos últimos 12 meses encerrados em setembro. Primeiramente, o que é deflação?

Como o cálculo de qualquer índice de inflação é uma variação média dos preços de um grupo de produtos, a deflação ocorre quando a variação média dos preços dessa cesta de produtos diminui, ao invés de subir. Esse fenômeno é bastante incomum, ocorrendo em situações muito específicas. Alguns países, em 2020, em decorrência da forte desaceleração da economia provocada pela pandemia, apresentaram deflação, como Grécia (-2,32%) e Eslovênia (-1,08%), puxados pela rápida queda de demanda naquele período.

Note que a pandemia, ao retrair de forma intensa o fluxo comercial, desorganizou amplas redes internacionais de produção e oferta, o que, na maioria dos países, levou à elevação dos preços médios por restrição de oferta. Os grupos de alimentação e insumos de produção são dois exemplos bem ilustrativos, que ainda hoje pressionam a trajetória da inflação no mundo.

O recente fenômeno de deflação entre julho e setembro no Brasil é consequência direta da redução da alíquota do ICMS sobre combustíveis e energia elétrica, com propósito de gerar um choque negativo sobre os preços. Além da redução direta dos preços destes bens, os mesmos provocam efeito de transbordamento sobre outros bens finais, dado que transporte e energia compõem o custo da maioria das cadeias de produção. Como resultado, o índice de inflação medido pelo IPCA ficou negativo.

Mesmo com deflação, muitos brasileiros não sentiram esse alívio nos preços, principalmente a classe mais baixa, onde o peso dos alimentos no orçamento mensal tem muito mais peso. Na média, em setembro, o grupo de alimentos respondeu por 21,8%, transportes por 20,7%, habitação 15,2% e saúde-cuidados pessoais, 12,7%.

No acumulado do ano e dos últimos 12 meses, dos nove grupos de produtos que compõem o cálculo do IPCA, apenas três apresentam variação acumulada abaixo do índice geral do IPCA. Dois deles são transporte e habitação, os dois influenciados pelo efeito direto da queda de preços dos combustíveis e energia elétrica com a redução da alíquota do ICMS.

Prazo de duração

Os demais grupos - compostos por alimentação, artigos para residência, vestuário, saúde, educação e despesas pessoais - apresentam inflação maior que a média de 4,09% no ano. Isso endossa a explicação de que a redução do ICMS tem efeito de corte segmentado e delimitado no tempo, já que a redução tem prazo de duração. Após este período, a elevação das alíquotas sobre combustíveis e energia provocará efeito rebote de ampliação dos custos de diversos setores da economia, cujos efeitos tenderão a pressionar a elevação dos preços.

É importante compreender que inflação é fruto, na maioria das vezes, de um processo dinâmico e dificilmente é resolvida com ações heterodoxas ou medidas de choques temporais. A curto prazo, estas medidas trazem alívio aos índices de preços, mas a médio prazo os resultados não são sustentáveis. A história econômica do Brasil está recheada de exemplos.

O desafio é identificar os fatores dinâmicos que impactam sobre a inflação e traçar ações para amenizar o efeito destes fatores. Hoje, boa parte das pressões inflacionárias está associada ao mercado internacional, como o preço dos alimentos e diversos insumos industriais. Isso tem provocado elevação da inflação em diversos países do mundo e pressionado Bancos Centrais de diversas localidades.

Expectativas

A expectativa é de que o IPCA para os próximos meses ainda continue nesse tom mais moderado. Contudo, segundo o relatório FOCUS, que reúne as projeções dos principais agentes de mercado, a inflação em 2022 deve fechar em 5,6%. Para 2023, a perspectiva é de uma inflação de 4,9%.

As duas projeções estão acima da meta estabelecida pelo COPOM (Conselho de Política Monetária). A título de ilustração e provocação, entre 1996 e 2021, o Brasil apresentou inflação média de pouco mais de 6% ao ano, medida pelo IPCA.

Material produzido por Sandro Renato Maskio, coordenador de Estudos do Observatório Econômico e professor do curso de Ciências Econômicas da Universidade Metodista de São Paulo e Natasha Jacoud, economista formada pela Universidade Metodista. 




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